- Do UOL Esporte - Em agosto de 2010, Orlando Silva Júnior comprou, por R$ 370 mil, um terreno no distrito de Sousas, em Campinas (SP)
Pela área de aproximadamente 90 mil m² passa um duto de gás da Petrobras.
Silva, que é ministro do Esporte desde 2006 e recebia à época da compra R$ 10.748,43 mensais, pagou o terreno a vista.Conforme documento obtido pela reportagem, ele usou cheque administrativo –modalidade que permite o uso do cheque sem que o pagador movimente sua própria conta.
Por meio de sua assessoria de imprensa, porém, ele deu outra versão. Afirmou ter pagado o terreno com um cheque pessoal.
Vista de 2010 do terreno comprado pelo ministro; hoje há casa em construção no local. Google Maps/Arte UOL.
O sítio do ministro é justamente o primeiro do lado esquerdo. Silva Júnior comprou um terreno que levou mais de um ano para ser vendido. Ele começou a construir uma casa perto do duto.
Documentos da própria companhia mostram que há planos para mudanças nos dutos localizados no Estado de São Paulo,
gerando alto risco de desapropriação.
Um funcionário do condomínio Colinas do Atibaia, onde fica a propriedade, disse ao UOL Esporte que a equipe de uma empresa que trabalha para a petrolífera esteve lá recentemente. Avisou que os primeiros terrenos à esquerda da portaria passarão por uma desapropriação parcial. O objetivo é evitar riscos de contaminação.
Procurada pela reportagem no sábado, a assessoria de imprensa da Petrobras informou na segunda que não haveria tempo hábil para responder as perguntas.
O PDD (Plano Diretor de Dutos), elaborado em 2007, mostra que uma das preocupações da Petrobras paulista é deixar os dutos que passam pelo estado mais longe dos vizinhos para diminuir riscos de acidentes. O documento indica que a distância para os dutos deve aumentar, o que forçará mudanças.
"Com o objetivo de diminuir as interferências das populações nas faixas, o projeto PDD/SP irá adotar um novo conceito de corredor de dutos, que consiste na implantação de faixas de dutos com maiores larguras (aproximadamente 60 metros), proporcionando um maior distanciamento entre as comunidades e as faixas", diz trecho do relatório produzido pela Petrobras há quatro anos.
Aumentar a faixa de dutos obriga a companhia a pagar ao proprietário da área um valor ainda maior para manusear o trecho do terreno. É o que pode acontecer com um pedaço da propriedade do ministro. Essas desapropriações costumam ser feitas em negociações entre os proprietários e a empresa.
Silva Júnior, porém, afirma desconhecer risco de desapropriações em sua área. Também diz não saber sobre as mudanças propostas pelo PDD.
De qualquer forma, quem, como Silva Júnior, tem trânsito na Petrobras, antiga parceira do Ministério do Esporte, pode conseguir um preço melhor na negociação com a empresa. O ministro se aproximou ainda mais da companhia por causa da questão dos dutos de Itaquera. Ele assinou como testemunha a carta de intenções entre Corinthians e Odebrecht para a construção do Itaquerão.
Além disso, Ana Cristina Petta, mulher dele, faz parte de uma companhia de teatro patrocinada pela Petrobras. Não é só.
A Agência Nacional de Petróleo, que regula as atividades da área, é controlada pelo partido do ministro. Haroldo Borges Rodrigues Lima, diretor-geral da ANP, é baiano e integrante PC do B, como Silva Júnior.
MINISTRO ENFRENTA SÉRIE DE DENÚNCIASOrlando Silva, estará nesta terça-feira, às 14h30, no Congresso Nacional para se defender das denúncias de corrupção feitas no fim de semana pela revista Veja e pelo Fantástico, da Rede Globo. A revista trouxe o depoimento do militar João Dias Ferreira acusando-o de ter recebido "uma caixa de papelão lotada de cédulas de R$ 50 e R$ 100, na garagem do ministério”. Silva se disse inocente e prometeu processar o PM, que está preso. Já o Fantástico apresentou suspeitas sobre a atividade da ONG Pra Frente Brasil, dirigida pela ex-jogadora de basquete Karina Rodriguez. A entidade mantém convênio de R$ 28 milhões com o ME e há acusações de desvio de dinheiro público. Silva pediu investigação sobre o caso.
OS DOCUMENTOS
Reprodução
O ministro e sua mulher compraram o terreno de um casal belga que foi representado por procurador.
Esse valor foi pago a vista por Orlando Silva Júnior com um cheque administrativo.
Assinatura do ministro no documento da compra.
A empresa pagou ao casal belga que era dono do lote um preço bem melhor em relação ao acertado com Silva Júnior, em um indício de que ter uma área transformada em servidão de passagem ou desapropriada pode ser um bom negócio até para quem não tem contatos na companhia. A petrolífera pagou R$ 5,96 pelo m², enquanto para o ministro cada m² custou cerca de R$ 4.
Em 2005, antigos donos receberam da Petrobras pela passagem do duto, como mostra escritura retificada e ratificada após venda para o ministro.
Antes de o ministro comprá-lo, o terreno já havia passado por três espécies de desapropriações parciais, chamadas de servidões de passagem. De acordo com certidão do imóvel registrada no 4º Oficial de Registro de Imóveis de Campinas, a Petrobras deu aos ex-proprietários, em 2005, R$ 54.297,91 por 9.095,87 m referentes a três faixas de terra.
A oferta da Petrobras foi bem melhor do que a de Silva Júnior, apesar de ter sido feita cinco anos antes. De lá para cá, houve uma explosão imobiliária, que não parece ter sido levada em conta.
Orlando fez um negócio da China em comparação com os terrenos à disposição no mesmo condomínio, mas na portaria vizinha. Sem dutos por perto, as propriedades custam entre R$ 15 e R$ 20 cada m², de acordo com um corretor consultado pela reportagem. Nessa área, um terreno de 20 mil m² está sendo oferecido por R$ 380 mil, quase a mesma quantia paga pelo ministro em 90.000 m².
O mesmo corretor diz que a área adquirida por Silva Júnior vale menos por causa de uma acentuada inclinação, por ter muitos carrapatos e pelo tempo que ficou encalhada.
Apesar de poucas casas por perto, o lote escolhido pelo ministro não favorece quem busca tranquilidade para passar os finais de semana com a família. Fica em frente a um pesqueiro, o que provoca grande movimentação aos sábados e domingos. O local é de acesso razoavelmente difícil, com um trecho de 9 km em estrada de terra.
A negociação com a Petrobras está detalhada na escritura de compra e venda do imóvel para o ministro e sua mulher, datada de 13 de agosto de 2010. No documento está escrito que a operação entre os belgas e a petrolífera ainda não havia sido registrada em cartório, o que só aconteceu em novembro daquele ano.
A escritura que concretiza a venda para Silva Júnior tem uma cláusula que define que a Petrobras poderá usar a sua faixa no terreno para a instalação de dutos, proteção dos mesmos e outras instalações. Ou seja, não estão descartadas novas obras no local.
As metas estabelecidas pelo Plano Diretor de Dutos transformam a área em que está a propriedade do ministro num local atrativo para operações da Petrobras. O projeto prevê desativação de dutos em áreas densamente povoadas e demonstra grande preocupação com a vizinhança.
O condomínio em que Silva Júnior está construindo é de propriedades rurais. Seu sítio é o primeiro na rota dos dutos no condomínio.
O ministro nega que sua propriedade fique num condomínio. De fato, a escritura não cita isso.
Entretanto, a reportagem do UOL Esporte esteve lá.
Para chegar ao terreno, precisou passar pelo portão 3 do Condomínio Atibaia. Na parede da portaria, foi colocado um papel com o nome de todos os moradores. À caneta, por serem mais recentes, aparecem Silva Júnior e Ana Cristina. A patente ministerial não aparece. Porém, os funcionários sabém que o dono do terreno em frente ao lote 07 comanda o Ministério do Esporte, apesar de afirmarem nunca terem visto o proprietário ilustre por lá.