A estimativa é que mais de 100 mil detentos sejam liberados. No DF, entre 200 e 300 pessoas poderão deixar o sistema carcerário.
- Do Correio Braziliense - A partir de 4 de julho, entra em vigor a Lei Federal nº 12.403, que traz importantes alterações no texto do Código Processual Penal sobre os critérios para a decretação da prisão preventiva no Brasil. Em linhas gerais, a nova legislação tornará esse tipo de detenção uma exceção, a ser aplicada em casos bem mais restritos do que permite a norma ainda em vigor, de 1941. A prisão processual não poderá mais ser aplicada a autores de crimes dolosos puníveis com reclusão inferior a quatro anos (veja arte). A polêmica em torno da regra se deve ao temor de que ela aumente a sensação de impunidade. Por trás da aprovação está o esforço do Estado em diminuir a superlotação dos presídios. Segundo o Ministério da Justiça, em 2010, 37% da população carcerária de todo o país — que hoje é de 496.251 pessoas — eram mantidos nas celas por conta da prisão provisória. A estimativa é que mais de 100 mil detentos sejam liberados. No DF, entre 200 e 300 pessoas poderão deixar o sistema carcerário.
A nova lei determina que os juízes recorram à preventiva em último caso. Antes disso, nove medidas cautelares devem ser aplicadas para monitorar o acusado ao longo dos trâmites jurídicos até o julgamento. Entre elas estão o comparecimento periódico em juízo, a restrição de acesso, o recolhimento noturno e a proibição de deixar a região. A detenção poderá ser aplicada em casos de acusados que já tenham condenação por outros delitos dolosos, que cometerem crimes cuja pena é superior a quatro anos de prisão ou tenham praticado violência doméstica familiar (Leia mais aqui).
Antes da reforma, diante de uma prisão em flagrante, a Justiça contava com apenas duas opções, a conversão em prisão preventiva ou a soltura do indivíduo. “Isso vai aumentar o leque de medidas que o juiz pode tomar. A lei está de acordo com o que diz a Constituição de 1988. A prisão é exceção”, afirma Márcio Evangelista, juiz da 5ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.
Segundo o Departamento de Estatística da Subsecretaria do Sistema Penitenciário do DF (Sesipe), até maio de 2011, o DF tinha 535 pessoas presas em caráter provisório por cometerem crimes com pena de reclusão de até quatro anos. Esse é o número de pessoas presas de forma preventiva ou temporária, sendo que essa última modalidade não teve o regime de aplicação alterado pela lei. Se esses detentos deixarem o sistema, haverá um alívio de 16,7% na superlotação dos presídios locais. Hoje, são 3,2 mil presos a mais do que a capacidade no sistema, já que as celas do DF têm espaço para 6,5 mil detentos, mas abrigam 9,7 mil.
“Boa notícia"
Para o subsecretário do Sistema Penitenciário do DF, André Victor do Espírito Santo, a medida deve desafogar o Complexo de Detenção Provisória (CDP), onde ficam os detentos à espera de julgamento. A partir da próxima semana, cerca de 10% desse total podem deixar o presídio. “De imediato, nós prevemos que haverá liberação de 200 a 300 presos. Para quem vive um problema crônico de superlotação, isso não deixa de ser uma boa notícia”, avalia. Espírito Santo reconhece, porém, que a mudança pode assustar a sociedade.
“Alguns fatos marcantes nas últimas semanas têm deixado a população um pouco sobressaltada. Esse sentimento de insegurança pode se intensificar”, pondera.
O Ministério Público do DF e Territórios entende que a lei acerta ao evitar a detenção de todos os infratores, mas garante ficar em alerta. “Em relação às situações que envolvem indivíduos perigosos, o MP deve providenciar que essa pessoa fique presa no andamento do processo. Vamos ficar em cima”, diz o promotor José Theodoro Corrêa, da 7ª Promotoria de Justiça de Entorpecentes.
Na opinião do delegado-chefe da 1ª Delegacia de Polícia, Watson Warmling, a nova legislação representa um retrocesso para a atividade policial. “Em termos de política pública contra a criminalidade, não vejo avanço algum. A polícia trabalha para ver os autores de crimes fora do seio da comunidade e, a partir do momento em que se criam outras medidas punitivas que não seja a prisão, dificulta ainda mais essa atuação”, critica Watson.
EssencialA prisão temporária é aplicada no curso de uma investigação, quando considerada imprescindível para as apurações do inquérito policial. A duração, em regra, é de cinco dias, mas há procedimentos que estipulam prazos maiores.
O que diz a leiA Lei Federal nª 12.403 alterou 33 artigos do Código de Processo Penal e reformou os critérios para a decretação da prisão preventiva. Além disso, resgatou a figura da fiança como uma das nove medidas cautelares que devem ter prioridade sobre a prisão. A fiança varia entre um salário mínimo (R$ 545) e 200 salários mínimos (R$ 109 mil).
Entre as sanções que poderão ser aplicadas pelo juízes estão ainda o recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tiver residência e trabalho fixos e a suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais.