Que venha o novo Cespe, a empresa pública dos concursos
- Por J.W. Granjeiro - A transformação do Cespe em empresa pública, vinculada ao Ministério da Educação, é uma iniciativa que pode trazer grandes benefícios para os concursos públicos no país. A idéia merece o nosso apoio, pois vai proporcionar ao Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília, uma agilidade e uma autonomia, administrativa e financeira, que deverão melhorar muito a sua atuação, além de atender às necessidades da administração pública com mais qualidade do que atualmente.Como já contei aqui, o Cespe foi criado por uma Resolução da Reitoria da UnB, há quase 18 anos, no dia 14 de dezembro de 1993, pouco mais de cinco anos depois da institucionalização do concurso como regra para o preenchimento de cargos públicos pela Constituição de 1988. Nestas quase duas décadas, ele se tornou a principal banca organizadora de concursos de todos os níveis da administração brasileira, nos três poderes da República, mas é necessário modernizar-se para acompanhar o crescimento do setor.
Essa modernização começa pela regularização do quadro funcional do Cespe, que, por mais absurdo que pareça, está completamente à margem das exigências constitucionais sobre concursos públicos. É espantoso constatar que o Centro não possui um quadro próprio de servidores, pois nunca realizou um concurso público para atender às necessidades do seu funcionamento. Como não tem quadro próprio, 400 funcionários trabalham como simples prestadores de serviços, sem nenhum vínculo ou garantia trabalhista. Outros 78 servidores, cedidos pela UnB, recebem ilegalmente a Gratificação Especial de Cursos e Concursos (GECC).
Depois de quase duas décadas, chegou o momento de se por um fim a tal anomalia, depois que o Tribunal de Contas da União publicou o Acórdão 3005/09. Nele, os auditores do TCU sugerem a criação da empresa pública, que, obrigatoriamente, num prazo de quatro anos, terá que organizar um processo seletivo para a contratação do novo quadro de servidores. Isso levou a UnB a colocar o assunto na pauta de discussões do Conselho Universitário (Consuni), que, no início deste mês, aprovou a mudança, com 36 votos favoráveis e seis contra.
Na imprensa, logo essa nova entidade que surgirá da reestruturação do Cespe ganhou o apelido de Concursobrás. Não gosto desse nome, que soa pejorativo, como se estivesse sendo criado um novo cabide de empregos no serviço público, muito ao contrário do real objetivo visado pela mudança. Que, aliás, dependerá ainda da avaliação dos ministérios da Educação e do Planejamento, além da Casa Civil, para decidir se será encaminhada uma medida provisória ou um projeto de lei ao Congresso Nacional. Creio que o Cespe, mesmo se tornando uma estatal de concursos públicos, deverá manter o nome e a sigla que o consagraram como a mais respeitável instituição do ramo no país. Nada de Concursobrás, portanto.
Conforme a proposta aprovada pelo Consuni, a futura empresa continuará funcionando nas dependências da UnB e a Universidade receberá repasses de, no mínimo, 10% do faturamento bruto obtido por ela, em valor a ser definido a cada ano pelo conselho de administração. Em 2010, a UnB recebeu cerca de 20% da receita do Cespe, o equivalente a R$ 54 milhões e a receita esperada com a mudança deverá se manter nesse patamar.
Vejo com muita satisfação a futura transformação do Cespe em empresa pública e acredito que a UnB, por seu Conselho Universitário, está no caminho certo, ao aprovar uma nova estrutura para a instituição, pois só assim ela estará à altura do crescimento que deverá ocorrer nos próximos anos na área de concursos. A renovação da máquina pública por meio de concursos é uma necessidade iminente, pois os estudos do governo mostram que, até 2015, será necessário preencher um milhão de vagas, abertas por meio de aposentadorias, falecimentos ou demissões. E só o Cespe tem tradição, expertise e know-how para isso.
Tal situação será ainda mais aguda com os eventos esportivos que o Brasil sediará nos próximos cinco anos – a Copa das Confederações em 2013, a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016. Por tudo isso, a nova instituição precisa de ter uma grande estrutura, com um quadro próprio, e o modelo atual é insuficiente, como ressalta o próprio diretor-geral do Cespe, Ricardo Carmona, que lembra as dificuldades para realizar o Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), e até a possibilidade de o TCU impedir a assinatura de novos contratos.
Com a transformação em empresa pública vinculada à UnB, tudo isso será resolvido. O novo modelo de gestão dará maior autonomia administrativa ao Cespe, ao retirar a subordinação à UnB, mas mantendo o vínculo com a Universidade. Com isso, a contratação de pessoal será facilitada, sob as normas da CLT, embora não seja dispensado o concurso público. Ao mesmo tempo, de acordo com a Lei 8.666 (Lei das Licitações), o Cespe, como entidade integrante da administração pública, poderá ser contratado por outros órgãos e entidades governamentais com dispensa de licitação, o que será fundamental para implementar a sua atuação.
Sei que existia na UnB o temor de que o Cespe perdesse suas raízes com a mudança na sua natureza administrativa. Mas isso não vai ocorrer, de acordo com a proposta aprovada pelo Consuni, o que considero mais um fator positivo na medida, já que como ressalta seu diretor, o foco em pesquisa será mantido e a futura empresa não se transformará em uma simples aplicadora de provas.
Resta agora completar esse salto na qualidade da organização dos concursos públicos no nosso país com a aprovação dos projetos que tramitam no Congresso Nacional, sob inspiração do MMC (Movimento em Defesa da Moralização dos Concursos Públicos), que temos a honra de liderar. No Senado, tramita o projeto que regulamenta os concursos, estabelecendo normas para garantir a sua credibilidade e os direitos dos concursandos; na Câmara, está em andamento o projeto que criminaliza as fraudes em concursos públicos, como penas de até oito anos de cadeia.
Estou certo de que a aprovação desses dois projetos no Congresso Nacional, ao lado da transformação do Cespe em empresa pública, proporcionará ao ambiente dos concursos públicos os elementos de transparência e credibilidade necessários ao cumprimento das determinações da Constituição de 1988, além de tranqüilidade para mais de 11 milhões de brasileiros que desejam se tornar servidores do governo pela porta da frente.
J.W. Granjeiro é Diretor-presidente do grupo Gran Cursos.