- Do Opera Mundi - Um grupo de mulheres decididas e uma estrada intransitável acabaram convertendo a vida sexual de uma pequena cidade da Colômbia em um assunto de Estado
Mais de três meses depois de terem iniciado uma greve de sexo, as mulheres e os homens de Barbacoas (oeste colombiano) estão celebrando o começo das obras na via que une o município à capital do estado de Nariño, Pasto.
Protesto de centenas de mulheres de Barbacoas chamou a atenção para mau estado de via; governo prometeu obras.
As "grevistas" prometiam negar relações sexuais com seus parceiros até que o governo iniciasse as obras. A cerimônia que deu início à rodovia ocorreu na última semana, com a presença do prefeito da cidade, do governador de Nariño e do próprio ministro dos Transportes da Colômbia, que representou no evento o presidente Juan Manuel Santos.
Essa não é a primeira vez que colombianas recorrem ao que chamam de "greve das pernas cruzadas" como forma de protesto.
Em 2006, as esposas de membros de algumas gangues do departamento de Pereira se recusaram a ter relações sexuais até que eles deixassem as armas.
“Ao todo, 300 mulheres estão de pernas cruzadas, porque essa é uma forma de protestarmos. Não vamos fazer sexo até que a estrada seja construída”, acrescentou a juíza. “Como estamos próximos ao Oceano Pacífico, onde se diz que as mulheres e os homens são muito calientes, decidimos fazer algo que geraria impacto e que afetaria os homens, que sempre foram muito passivos com relação à realidade de Barbacoas.”
Entre os homens da cidade, que em sua maioria vive da mineração e da pesca, as reações foram variadas: alguns ficaram com raiva, outros se mostraram solidários e uma parcela propôs uma alternativa radical: iniciar uma greve de fome. “Melhor não comer do que ficar sem sexo”, disseram. A melhoria da estrada permitiria também aos trabalhadores vender seus produtos em cidades próximas e economizar com o custo da alimentação, pois o transporte de alimentos é 10 vezes mais caro. Uma dúzia de ovos custa 25 mil pesos (14 dólares) em Barbacoas, enquanto em Junín vale seis mil (três dólares).
Promessas
O Invia (Instituto Nacional de Vias) encarregou o terceiro batalhão de engenheiros em 2010 de melhorar a estrada antes de julho desse ano, mas nada aconteceu em Barbacoas – ninguém viu máquinas ou operários.
"Na cidade estão nos dando os parabéns, mas muitos dizem: 'Como assim que as pernas não estão mais cruzadas? Aguentem até que nós tenhamos segurança, até que tenhamos a rodovia (pronta)'. Mas nós já nos desmobilizamos", comentou Maribell Silva, juíza local e uma das organizadoras do protesto - do qual participaram quase 300 mulheres e alguns homens de Barbacoas.
A desconfiança se explica porque, segundo Silva, o orçamento para a pavimentação da rodovia já havia sido aprovado e desembolsado pelo governo em ao menos cinco ocasiões prévias. Mas a via, de 57 km de extensão, continua praticamente intransitável.
"A corrupção a destruiu, (a via) foi roubada. E roubaram toda uma comunidade, porque não se trata apenas de um município. A rodovia vai beneficiar ao menos três cidades", agregou a juíza.
O caminho a Barbacoas enfrenta outro problema além de seu mau estado: é conhecido pela presença de diversos grupos armados.
Com a chegada das chuvas as estradas estão em péssimo estado.
Localizado entre a fronteira colombiana com o Equador e o oceano Pacífico, o estado de Nariño é estratégico para as guerrilhas das Farc e do ELN, bem como para gangues criminosas de origem paramilitar que se dedicam ao narcotráfico.
O município de Barbacoas também é rico em ouro, mineral que vem se convertendo em uma importante fonte de recursos financeiros para os grupos armados ilegais.
E todos esses fatores influenciaram na hora que as mulheres decidiram optar pela "guerra do sexo" como forma de despertar atenção para a situação local.
Barbacoas tem pago um preço alto por sua inacessibilidade. As sete horas necessárias para percorrer os 57 km da rodovia não asfaltada são excessivos, por exemplo, para pessoas que precisam de atendimento médico urgente.
"Fui testemunha da morte (na rodovia) de uma mulher em trabalho de parto, uma jovem de 22 anos. Foi algo marcante para mim", relatou Silva. "Este município está totalmente atrasado. Temos que tomar banho e cozinhar com a água da chuva, porque não temos dutos de água."
Para ela, o aparente sucesso da greve de sexo em Barbacoas pode servir de exemplo para o resto da Colômbia.