- Por Mary Zaidan - Com uma definição elástica para classificar jovens, que se estende até os 29 anos, o Estatuto da Juventude aprovado pela Câmara dos Deputados traz mais absurdos do que o festival de meias-entradas que criou polêmica durante a semana.
Estrategicamente inclusos entre seus 60 artigos estão a adoção de cotas para o ensino superior, elegantemente chamada de políticas afirmativas, matéria que deveria, no mínimo, ser objeto de emenda constitucional, e outros ardis que parecem pouco, mas não são.
Entre eles, a destinação obrigatória de 30% dos recursos do Fundo Nacional de Cultura para projetos voltados a jovens, sabe-se lá o que isso quer dizer. Traz ainda, como era de se prever, regras para a mídia: a criação em redes de rádio e televisão de horários especiais voltados para a realidade social do jovem. Outra incógnita.
Nas meias-entradas, a discussão girou quase que exclusivamente em torno da Copa 2014. Mas é muito mais do que isso. Intromete-se nas esferas estadual e municipal, tanto no que diz respeito aos ingressos para eventos artístico-culturais quanto no transporte público. Esse, aliás, um privilégio difícil de justificar.
Jovens estudantes passam a pagar 50% das passagens intermunicipais e interestaduais, independentemente da finalidade da viagem. Um estranho benefício que obriga os acima de 30 a custear o transporte até de marmanjos de 29 anos.
Não menos absurdo é garantir aos designados como jovens-adolescentes (15 e 16 anos), jovens-jovens (18 a 24 anos) e jovens-adultos (25 a 29 anos) direitos assegurados a todos os indivíduos, jovens ou não. Reescreve-se nos artigos, parágrafos e incisos que os jovens não serão discriminados por etnia, raça, cor de pele, cultura, origem, idade, sexo. Garante-se ainda a liberdade de reunião, de idéias e de expressão. Ora, estranho seria se não assegurasse o que a Constituição já consagra.
A lei, que ainda terá de ser votada pelo Senado, define dezenas de obrigações do Estado. Põe no papel um país imaginário. Muito distante do país que na mesma semana da aprovação do estatuto viu os resultados pífios do ProJovem.Nos últimos seis anos, o programa federal destinado a resgatar jovens que estão fora da escola torrou R$ 3 bi. Na versão urbana, formou menos de 210 mil alunos, apenas 38%. Na área rural, 59 mil, só 1%. Com fiscalização perto de zero, há desvio de recursos, indícios de corrupção.
Nada que um estatuto resolva.
O Brasil é uma nação jovem, uma democracia jovem. Assim como muitos jovens, usa a juventude para justificar seus tropeços. E abusa nos piores vícios. Nada que um estatuto resolva.
Mary Zaidan é jornalista, trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas em duas campanhas e ao longo de todo o seu período no Palácio dos Bandeirantes. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa.