- Do G1 -
Qualidade do atendimento na saúde é uma das principais reclamações
Paraenses vão às urnas em 11 de dezembro para votar em plebiscito.
A vida dos moradores das comunidades de Santarém, cotada para ser a capital de Tapajós caso a divisão do estado do Pará seja aprovada em plebiscito no dia 11 de dezembro, gira em torno dos rios Tapajós e Amazonas.
É deles que os moradores tiram o sustento e onde passam a maior parte do tempo, pois as viagens de barco duram entre 5 e 20 horas. A reportagem percorreu o Pará por dez dias para ouvir o que o povo pensa sobre a possível separação.
“É claro que vamos conseguir nos separar. Assim vamos ficar independentes de Belém. Hoje, tudo que se faz aqui precisa de uma autorização de lá. Se dividir muita coisa vai melhorar, porque vai ser resolvido tudo aqui, principalmente na parte de saúde. Nesta região, nada presta. Não presta saúde, comunicação, estradas”, afirma o agricultor Bazinho Nobre, que viaja 17 horas de barco de Lago Grande para Santarém para consultas médicas.
Carro em Santarém com adesivo de apoio à separação (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Em outra embarcação, a professora Ivanilde Costa também diz que votaria no “sim” à separação do Pará.
“Aqui não tem emprego, a população jovem tem que ir embora para estudar e crescer. A separação seria uma forma de nós definirmos nosso próprio futuro”.A mesma impressão relatou ter a dona de casa Cleumira Motta, que pela manhã faz ginástica em uma academia pública montada em uma praça.
“Montamos na igreja e na nossa comunidade um grupo para estudar e analisar o que era melhor para Santarém. Chegamos à conclusão que, dentre os pontos positivos e negativos, só temos a ganhar. Por isso, todo mundo aqui vai votar pelo ‘sim’. Eu tenho até adesivo colado na porta da minha casa e no carro. Queremos a separação para poder crescer”, diz.
Cleumira Motta discute divisão do estado enquanto faz ginástica em praça (Foto: Tahiane Stochero/G1)
De acordo com o Instituto de Desenvolvimento Econômico, Social e Ambiental do Pará (Idesp), com o desmembramento do estado, Tapajós ficaria com a maior parte do território (59%) e com a menor população (15%). Mas também teria a menor renda média do trabalhador e também o menor PIB per capita.
G1 entrou em sala de parto de hospital e encontrou sujeira (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Reclamações na saúdeUma das principais reclamações dos santarenos é quanto à qualidade do atendimento na área da saúde. O hospital municipal da cidade é superlotado. Todos os pacientes que chegam de comunidades vizinhas são levados para lá, onde são analisados por médicos e, se necessário, recebem a recomendação de transferência para o Hospital Regional de Santarém.
Os hospitais são dois extremos: enquanto o primeiro é sujo, com mau cheiro e superlotado; o segundo é limpo, com música ambiente e bem higienizado. Neste, também há filas, mas a maioria para consultas pré-agendadas ou realização de exames.
“Você não está sentindo cheiro ruim aqui dentro? E tem muita sujeira. Não limpam”, reclama a agricultora Idelina Nogueira, que acompanhava uma tia com problemas cardíacos e estava internada no hospital municipal.
O G1 teve acesso a a unidade, inclusive a berçários e sala de parto, onde havia sujeira e sangue no chão.No Hospital Regional de Santarém, setor de marcação de consultas fica lotado (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Já no hospital regional, Mércia Pepe Batista agendava exames para a irmã, que sofre de câncer, e reclamava da dependência da região da capital.
“Somos paraenses, mas queremos que seja criado Tapajós. Eu vou votar no ‘sim’. Hoje, tudo depende de Belém. Minha irmã precisa de uma bolsa de colostomia que tem de vir da capital. Durante seis meses, ela ficou sem a bolsa e teve que comprar”, conta.
“Para nós, é difícil reclamar de qualquer serviço público.
Sempre que se liga para uma central de atendimento, como para pedir reparos em iluminação ou telefonia, cai em Belém. Lá, ninguém sabe onde ficam as ruas em Santarém”, reclama Mércia.
O secretário de Saúde, Emmanuel Silva, diz que o Hospital Municipal de Santarém atende pacientes de 19 municípios vizinhos, realizando cerca de 400 atendimentos diários de emergência e bem mais que sua capacidade. Ele afirmou que uma licitação foi realizada para contratar nova empresa responsável pela limpeza do hospital.
Maria Soares vive em unidade habitacional invadida em Santarém (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Dependência da capitalEm Santarém, o G1 ouviu diversas vezes as frases “tudo depende de Belém” e “nos vermos independentes de Belém”, quando questionava a população sobre o motivo da separação.
Até mesmo a desempregada Maria Soares, que invadiu uma das unidades habitacionais que estão sendo construídas com investimento do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) no bairro do Uruará, usou a expressão.
“Nos mudamos para cá há poucos dias porque vivíamos em uma área alagada e de palafitas logo ao lado. Estas casas estavam desocupadas e resolvi entrar. Eu estou credenciada para receber uma das casas,
mas como o dinheiro sempre depende de Belém para vir para cá, isso está demorando anos”, diz Maria. “Eu e todos os meus filhos e parentes vamos votar a favor da separação de Tapajós. Quem sabe assim nossa região cresce mais rápido, desenvolve-se. Nunca tive condições de viver bem”, afirma.
O secretário municipal de Planejamento, Everaldo Martins, diz que, apesar de paralisações temporárias, as obras do PAC em Uruará foram retomadas e que, até o fim ano, a prefeitura deve entregar mais de 100 casas. “Algumas famílias que invadiram as casas em construção estão cadastradas e têm direito às moradias. As que não têm direito terão que sair assim que a obra ficar pronta”, afirma Martins.
Um dos pontos turísticos de Santarém é um paraíso perdido na Amazônia. As praias de rio de Alter do Chão atraem curiosos do mundo inteiro. Mas as pessoas que moram ali não estão satisfeitas. Acreditam que o governo paraense aplica pouco no turismo e que só com a criação de Tapajós haverá desenvolvimento.
Alter do Chão tem praias de rio e os moradores cobram mais investimentos no local (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Para a prefeita Maria do Carmo Lins Lima, “o clima é de euforia” em relação ao plebiscito porque a região espera pela separação há 150 anos. “É uma reivindicação antiga do nosso povo. Se tem problemas aqui, há também no Brasil inteiro. Acreditamos que, se começar um estado novo, podemos ter mais condições de solucioná-los”, afirma.
Plebiscito
Os eleitores do Pará irão à urnas em 11 de dezembro para responder a duas perguntas: “Você é a favor da divisão do estado do Pará para a criação do estado do Carajás?” e “Você é a favor da divisão do estado do Pará para a criação do estado do Tapajós?”.
Em um possível cenário de divisão do Pará, o futuro estado de Carajás será composto por 39 municípios, tendo Marabá como capital; o estado de Tapajós, 27 municípios, e Santarém como capital; e o novo Pará, 77 municípios, e Belém continuaria sendo a capital.