"Não tem essa de excluir a presidente e o PT dessas denúncias. Porque é um governo só, uma autoridade só. E quem responde pelo governo é a presidente e seu partido também"
Do presidente do PSDB, Sérgio Guerra, em entrevista ao UOL Notícias.
- Por Fábio Brandt, do UOL Notícias - O mérito da presidente Dilma Rousseff após o primeiro semestre de governo é ter afastado do governo ministros envolvidos em escândalos, disse em entrevista ao UOL Notícias o presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PSDB-PE). Segundo ele, “mesmo com atraso, [Dilma] toma providências reais para afastar do comando de operações públicas pessoas que não deviam estar lá”.Sergio Guerra - Foto Luiz Carlos Marauskas/Folhapress.
No entanto, Guerra afirmou que Dilma tem sua parcela de culpa nas recentes crises, porque fez parte do governo Lula. “Não tem essa de excluir a presidente e o PT dessas denúncias. Porque é um governo só, uma autoridade só. E quem responde pelo governo é a presidente e seu partido também”, disse em referência aos recentes episódios em que Antonio Palocci (ex-Casa Civil) e Alfredo Nascimento (ex-Transportes) deixaram seus ministérios por serem protagonistas de supostos escândalos de corrupção.
O tucano disse também que a oposição teria menos problemas de atuação se o Parlamento tivesse uma estrutura para acompanhamento e fiscalização das ações do governo. Uma das propostas do PSDB para reverter esse quadro é instalar no segundo semestre um “shadow cabinet” –espécie de “ministério” oculto, em que a oposição designa porta-vozes para fiscalizar assuntos específicos no governo.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
UOL Notícias: O procurador-geral da República recomendou a condenação de 36 reús do mensalão. Ele também pediu absolvição do ex-ministro da Comunicação Social, Luiz Gushiken. Como o senhor recebeu a notícia?Sérgio Guerra: É positiva a confirmação do procurador. Não me surpreende a exclusão de um nome [Luiz Gushiken, ex-ministro da Secom] porque um julgamento pode confirmar ou não as denúncias e responsabilidades. Não dá para deixar de considerar a hipótese de que ele [o procurador-geral] trabalhou com justiça e correição.
UOL Notícias: O governo Dilma já perdeu dois ministros por causa de suspeitas de corrupção levantadas pela imprensa. A oposição está cumprindo com razoabilidade o papel de crítica?Guerra: Foram dois afastamentos de ministros que ocupavam ministérios muito importantes. No caso do Ministério dos Transportes, um dos fatos noticiados já era de domínio público. Na comunidade que cuida da engenharia e das obras pesadas, o questionamento de procedimentos do Ministério dos Transportes vem de longa data. O fato de afastar alguns [ministros] não representa de maneira nenhuma a solução. A primeira atitude da oposição é exigir solução. Que o preço das obras no Brasil, especialmente dessas obras rodoviárias e ferroviárias, seja recomposto para uma base aceitável. Segundo: que façam investimento de qualidade no setor. Na falta de qualidade o que se agrava é a crise mais importante que é a crise da infraestrutura rodoviária e ferroviária. Terceiro: do ponto de vista político, no caso do Ministério dos Transportes, fica evidente que um partido ou grupos indicam autoridades para desenvolver ações que não são republicanas.Esse fato não tem origem no governo da Dilma. As nomeações que resultaram nas demissões de agora têm origem no governo anterior, do qual participou do comando a atual presidente. As denúncias são feitas quase que mensalmente e o governo não toma providências que só tomaria como agora, no caso de um esquema que foi desvendado de maneira clara pela imprensa. Essa questão é sistêmica, a forma de governar, de garantir maioria e a relação com grupos políticos que contaminam o ambiente público. No caso do Palocci, ele era mais do que um ministro. Ele era símbolo do governo, chefe dos ministros. O chefe do PT, o chefe do país, um dos chefes do governo que foi afastado por razões públicas que resultaram de reclamação da imprensa. Isso tudo não pode ficar assim. Nem os afastamentos podem ficar assim, sem punição. E não pode ficar assim o sistema que produz isso.
UOL Notícias: O que mais a presidente Dilma poderia ter feito além de afastar esses ministros?Guerra: Primeira coisa que ela deveria ter feito era não nomear esses ministros. A segunda coisa que ela deveria ter feito era tomar providências com mais rapidez. Penso que a presidente Dilma é constrangida a conviver com a operação governamental defeituosa e sobre a qual ela não interveio minimamente.
UOL Notícias: E qual o papel da oposição neste momento?Guerra: O Parlamento de maneira geral tem grandes defeitos. O primeiro importante defeito é que ele não tem estrutura adequada para acompanhar estruturas governamentais. E a oposição se dá de maneira especial no Parlamento. Ela não consegue se antecipar aos fatos e muito menos consegue acompanhar os fatos. Além do mais, a maioria governamental é brutal. O que temos que fazer na oposição é desenvolver estruturas capazes de fiscalizar efetivamente o governo. A ideia do “shadow cabinet” [expressão inglesa para designar porta-voz da oposição que fiscaliza assuntos específicos no governo] para nós faz todo sentido. Desenvolver núcleos que vão acompanhar setores e tenham capacidade de fazer esse acompanhamento com método e base técnica para que a oposição não se alimente apenas das denúncias que a imprensa publica.
UOL Notícias: Por que ainda não foi implementado o “shadow cabinet”?Guerra: Nós estamos reestruturando o partido, remodelando o partido. Essa ideia já está aprovada entre nós. Deve se consumar agora no segundo semestre.
UOL Notícias: Além de exercer o papel de crítica, a oposição tem passado por uma mudança de discurso. Principalmente por parte do senador Aécio Neves e do ex-presidente Fernando Henrique, no sentido de se aproximarem da presidente Dilma. O senhor percebe uma mudança no tom com relação ao governo?Guerra: Não percebo nenhuma mudança. Não dava para fazer oposição ao governo que estava se instalando, nos seus primeiros meses. É bom lembrar que esse governo já deve ser criticado por não nomear sequer o segundo escalão. Não havia porque fazer oposição precoce, colidindo de maneira precipitada com o resultado das urnas, que elegeu a presidente Dilma. Mas nossa oposição parlamentar nunca foi tão forte, no sentido de que nunca houve tanta qualidade. A oposição tem dois grandes defeitos, que não dependem exatamente dos parlamentares. O primeiro é que tem necessidade de um gabinete de acompanhamento e fiscalização. O segundo é que a palavra do Parlamento está muito esvaziada. A instituição Parlamento tem perdido ao longo dos últimos tempos muita confiança e credibilidade. A oposição não tem capacidade no Congresso de derrubar as votações do governo. Ela tem que conseguir falar, de maneira eficaz, com a sociedade. Esse é o nosso esforço. Com relação ao comportamento de Aécio e de muitas lideranças do PSDB, o que todos somos é prudentes. Nada de jogar palavras ao vento. Nada de repetir todo dia as mesmas coisas que não produzem resultado nenhum. Não houve mudança de discurso do Aécio. O discurso que ele fez no Senado há cerca de dois meses antecipava uma política mais efetiva de combate à ação governamental.
UOL Notícias: Fazendo um balanço deste primeiro semestre, o senhor percebe algum mérito na gestão da presidente Dilma?Guerra: Eu percebo sim. Acho que quando a presidente, mesmo com atraso, toma providências reais para afastar do comando de operações públicas pessoas que não deviam estar lá, ela ajuda o Brasil e ajuda a democracia. Não podemos deixar de reconhecer isso. Mas temos que afirmar a verdade: o governo [anterior] era o PT. Então [eles do PT] são os responsáveis por esses desequilíbrios. Responsáveis por essas nomeações e por essa forma de governar. A forma real de governar e de manter a maioria não foi minimamente alterada e a ação da presidente não consegue ser efetiva. Não tem essa de excluir a presidente e o PT dessas denúncias. Porque é um governo só, uma autoridade só. E quem responde pelo governo é a presidente e seu partido também.
UOL Notícias: Aparentemente houve uma dissidência na oposição quando Kassab [prefeito de São Paulo] anunciou a criação de um partido novo com a indicação que será próximo da base da presidente Dilma. O PSDB sente essa perda?Guerra: O Kassab nunca desenvolveu uma ação de oposição. Ele governou a cidade de São Paulo e teve conosco uma forte aliança. O projeto dele do partido é legítimo. Eu pessoalmente discordo, acho que partidos não podem ser formados da forma como o partido do Kassab está se formando. Porque ele reúne descontentes e lideranças que estão desequilibradas nas suas bases em torno de uma legenda e objetivos absolutamente não programáticos. Objetivos meramente eleitorais.
UOL Notícias: Mas o PSDB pode fazer alianças como PSD eventualmente?Guerra: É claro. Não é recomendável ao PSDB fazer alianças com o PT. Mas estamos abertos a alianças no geral. Por que não com o partido do Kassab?
UOL Notícias: Recentemente o ex-presidente Fernando Henrique deu muitas entrevistas por causa de seu aniversário de 80 anos. Em uma delas, falou que o que separa o PSDB e o PT é essencialmente a disputa pelo poder. Como o senhor interpretou essa declaração?Guerra: O que o presidente Fernando Henrique diz é que o PT e o PSDB muitas vezes têm objetivos semelhantes. Falo em relação a políticas sociais, ao ajuste fiscal e ao controle monetário. Nossos pontos de vista são semelhantes. A diferença central está na forma de conduzir o governo e na forma de constituir o poder. Os petistas governam de um jeito, constituem sua maioria de um jeito, fazem suas campanhas com alguns métodos que não são os nossos. Nos procedimentos estamos muito distantes.
UOL Notícias: Qual projeto o PSDB vai mostrar agora para os cerca de 40 milhões de eleitores que votaram no Serra em 2010?Guerra: Nós estamos desenvolvendo esse projeto. Agora com a colaboração do Instituto Teotônio Vilela. Mas nós temos que ter identidade, posicionamento, para que possamos ser reconhecidos de maneira global e geral. Segundo, nós temos que ter métodos de organização de outro tipo, contemporâneo. Isso vale para ação no Congresso, para ação de comunicação e implica numa democratização do partido.
UOL Notícias: Como o partido está se preparando para as eleições municipais de 2012?Guerra: Reconhecemos já no Brasil todos nossos pontos fortes e fracos. Estimamos as eleições municipais que podemos vencer. Pré-selecionamos de forma inédita, para começo de trabalho, um total de 400 municípios que somam basicamente 60% do eleitorado brasileiro. Agora vamos detalhar esse conjunto, com prioridades diferentes. A partir do próximo mês vamos começar a trabalhar todos aqueles municípios que têm segundo turno, que são municípios que têm centralidade, capacidade de formar opinião dos outros municípios. Nossa primeira estimativa é que nós vamos eleger entre 900 e mil prefeitos.
UOL Notícias: Como o conselho político presidido pelo ex-governador José Serra vai participar da escolha dos candidatos?Guerra: O conselho político vai ter uma atitude de discussão nacional, de definição das nossas macropolíticas. Mas tarefas como definir candidatos são do partido, da Executiva do partido. Não o conselho político. O conselho é o órgão que vai decidir, quando instado pela Executiva Nacional, sobre coligações nacionais, sobre o processo de escolha dos candidatos nacionais, portanto sobre a realização de prévias. Será referência para nossas decisões no campo prático e operacional. A escolha de candidatos não é tarefa nem do conselho político, nem da Executiva Nacional. É tarefa das convenções partidárias.
UOL Notícias: O senhor foi reconduzido à presidência do partido em um período difícil. Primeiro, a derrota na eleição presidencial. Depois, uma enxurrada de notícias negativas sobre a divisão interna do PSDB e sobre suposta atuação do ex-governador Serra contra sua reeleição. Como o PSDB tenta superar esse período negativo?Guerra: Já superou. A convenção me elegeu por unanimidade, a mim e à Executiva. E o partido está interagindo com toda sua liderança e também com o governador José Serra, que é um dos nossos maiores líderes.
UOL Notícias: O Serra tem espaço para disputar a eleição em São Paulo se quiser?Guerra: O Serra é, entre nossos líderes, aquele que tem a maior densidade popular, eleitoral. Disputou a eleição para presidente da República e obteve 40 milhões de votos. O Serra é uma pessoa com larga capacidade propositiva. É evidente que, em São Paulo, ele e o governador Geraldo Alckmin estão entrosados para nossa vitória, seja nas campanhas para eleição de prefeitos [no interior] e de maneira especial na capital.
UOL Notícias: Qual a importância de ter Aécio Neves como representante do partido no Senado? Qual papel ele deve desempenhar como líder do partido?Guerra: Como líder do partido, a inteligência e o senso de liderança política de Aécio são relevantes. Ele tem grande influência sobre tudo o que fazemos. No Senado, ele tem sido um senador de excelente qualidade, cumprindo o que prometeu. Fazendo um mandato que o credencia cada vez mais. E do ponto de vista real, ele é, nas expectativas do partido, para grandes projetos.
UOL Notícias: Pensando na eleição presidencial de 2014, ele [Aécio] é o grande nome que desponta no partido?Guerra: Efetivamente é um grande nome. Também é verdade que é do partido. Mas eleições de 2014 nós vamos cuidar daqui a dois anos, não agora.