- Do Correio Braziliense - A promoção oficial de festas, shows e eventos esportivos tornou-se instrumento recorrente de desvio de recursos públicos na capital da República. Nos últimos anos, há notícia de superfaturamento em cidades espalhadas pelos quatro cantos do Distrito Federal. Muitas das acusações foram investigadas e, diante dos indícios de irregularidades, deram origem a ações de improbidade administrativa apresentadas pelo Ministério Público à Justiça. Mas, na maioria dos casos apontados nos últimos quatro anos, não houve decisão definitiva nem punição dos supostos envolvidos. A demora na tramitação dos processos encoraja políticos, gestores públicos e empresários a continuarem usando o mercado da diversão como uma brecha por onde escorre verba pública.De cinco ações ajuizadas sobre shows superfaturados, ninguém foi punido!
Desde 2008, foram formuladas, pelo menos, cinco ações de improbidade administrativa ajuizadas pela 6ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social do Ministério Público (Prodep) para as quais até hoje não há desfecho na Justiça. O valor somado das causas chega a quase R$ 2 milhões (veja quadro), dinheiro que, segundo o MP, deve retornar aos cofres públicos. Os processos se referem a diferentes eventos, em cidades distintas. Mas o método de desvio quase sempre é muito parecido e já manjado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público, o que infelizmente não inibe as fraudes.
Aproveitando -se do caráter subjetivo, que envolve a contratação de artistas, gestores e políticos mal-intencionados beneficiam empresas de parentes, superfaturam cachês e pagam por produções aquém do que o ajustado em contrato.A dupla César Menotti e Fabiano.Uma das ações de improbidade administrativa relata o superfaturamento em um show da dupla César Menotti e Fabiano em Planaltina. O valor do contrato acertado à época com a Secretaria de Cultura foi R$ 258 mil. Mas nota fiscal apontou que os artistas receberam R$ 120 mil e o restante ficou para a empresa Campos e Silva Promoções, que representava a dupla. O Ministério Público até entende que possa haver justificativa para a dispensa de licitação na escolha da banda (por se tratar de caráter subjetivo), mas reprova a falta de concorrência pública para a produção do evento, que, a exemplo desse caso, é mais dispendioso que o próprio cachê. Essa ação foi ajuizada em 17 de junho de 2008, mas o processo só foi aberto em 25 de abril de 2011, quase três anos depois.Victor e LéoInoperanteNa contratação do show de Victor e Léo para a festa da virada de 2007 na Esplanada dos Ministérios, o MP detectou irregularidades, mas ainda assim a inicial do processo até hoje não foi aceita pelo Judiciário. À época, o governo empenhou R$ 480 mil para o pagamento do cachê dos artistas e a produção do evento. Segundo os promotores de Justiça, no entanto, o governo não conseguiu justificar os gastos, como o da contratação de um táxi aéreo de Uberlândia para Brasília, orçado em R$ 44 mil. O MP descobriu que a Aeromil, empresa que teria prestado o serviço, não estava autorizada a operar desde 2003 e que o último voo teria ocorrido em 2004. Por isso, além do valor total pago, a ação de improbidade administrativa sugere multa de duas vezes a quantia do suposto prejuízo.
Em Santa Maria, cinco bandas foram contratadas para a 17ª Festa de Aniversário da cidade, a Fassanta. Todas elas receberam menos do que apontavam notas de empenho, o que de certa forma explica a razão de cachês desproporcionais à notoriedade de algumas atrações. Nessa festa, se apresentaram, por exemplo, o cover da banda Chiclete com Banana. O cachê oficial era R$ 45 mil. Mas o grupo recebeu, de acordo com a ação do MP, R$ 25 mil. A banda de pagode Soweto tocou por R$ 38 mil, mas, no contrato, constava R$ 10 mil a mais. O suposto superfaturamento na Fassanta de 2007 gerou uma ação na Justiça recebida em julho de 2009, para a qual, até hoje, não há uma sentença. Durante todo o ano de 2010, o processo só teve quatro movimentações judiciais, um dos indícios de lentidão para o encerramento do caso.Benedito Domingos - Indícios de mais irregularidades.InvestigaçãoCinco inquéritos policiais apuram indícios de irregularidades cometidas sob a influência do deputado distrital Benedito Domingos, entre os quais fraudes nos carnavais de 2009 e 2010, no 49º aniversário de Brasília, no Natal de 2007 e em serviços realizados na Praça Central de Taguatinga. Essas investigações foram originadas a partir de operações que já renderam duas denúncias contra Benedito. Na Operação Balder, a polícia investiga festa em Planaltina na qual o contrato previa carpete, mas a festa ocorreu em chão de terra batida.
Operação Bragi
O que diz a lei?A Operação Bragi, deflagrada pela Polícia Civil em 24 de novembro de 2010, investigava supostas irregularidades em shows patrocinados por administrações regionais e tinha como envolvido o Sindicato dos Músicos do Distrito Federal. A entidade era acusada de cobrar dos músicos uma percentagem do cachê recebido, já que as bandas só conseguiriam fechar contrato com o governo se os músicos fossem registrados no sindicato. O inquérito se tornou o processo nº 2010.01.1.229787-6, que tramitava na 3ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, mas foi arquivado por falta de provas. O Sindimusi afirma, em nota, que é inocente das acusações e que de fato representa "os músicos em contratações pelo GDF, mas em nenhum minuto sequer usurpamos qualquer valor do Músico Trabalhador, que não fosse imposto".
Em 2000, uma alteração na Lei nº 8.429, de 1999, incluiu a fase inicial na tramitação de ações por improbidade administrativa. A etapa prevê que os réus apontados pelo Ministério Público apresentem uma defesa preliminar à Justiça, que vai analisar os argumentos em caráter preparatório. Só depois dessa etapa é que o juiz definirá se aceita ou não abrir o processo e, em caso afirmativo, citará as partes envolvidas. O procedimento é visto por integrantes do MP como um dos fatores que atrasam a tramitação das ações de improbidade nos tribunais de Justiça.